Madur ao Infocul: “Canto fado sempre com a verdade do que sinto no momento”

Cláudia Madur ou simplesmente Madur, acaba de lançar o seu disco homónimo, o segundo da carreira. Mulher do Norte, natural de Baião, desde cedo tem a música na sua vida, o Fado surge na adolescência. Em entrevista ao Infocul.pt a fadista fala-nos sobre o disco, a carreira, a digressão e o estado actual do Fado.

 

“Madur” é um convite a viajar do Fado tradicional às novas sonoridade que passaram a acompanhá-lo. Tudo isto através da voz de Cláudia Madur, de timbre suave. Numa longa entrevista ao Infocul a fadista revela-nos tudo obre o disco, desde a sua concepção a quem o integra, desde músicos a compositores.

 

 

A sua ligação à música começa muito cedo. Aos seis anos iniciou a sua formação na Casa da Música de Baião, sua terra natal. Como encarou essa experiencia que foi incentivada pelo seu pai?

 

O meu pai sempre quis que tanto eu como a minha irmã tivéssemos formação musical. Quando tinha cerca de 6 anos, dei os primeiros passos na minha aprendizagem. Comecei a aprender a ler e a escrever ao mesmo tempo que aprendia solfejo e lia pautas de música.

 

 

Começou inicialmente pelo clarinete, passando posteriormente para o piano. Quando descobre que a sua vocação era o canto?

 

Na verdade, recordo-me que quando se falou em casa que eu ia para a “escolinha de música” eu associei logo a “cantar”. Na minha expectativa eu ia aprender a cantar, que na verdade já era isso que queria. Naquela altura não havia aulas de canto na minha escola e tive de começar pelo mais básico, aprender a ler pautas e solfejo. Meses mais tarde, e ainda por influência do meu pai, fui aprender a tocar Requinta, que é uma espécie de Clarinete mais pequeno e adaptado a crianças. Foi uma tentativa completamente frustrada, tal como a de piano que se seguiu. Lembro-me que ia a chorar para a escolinha de música porque eu só queria cantar, e não gostava de tocar nenhum instrumento. Uns anos depois acabei por desistir e fui cantando em festas da escola primária ou de família, fui aprendendo de forma natural, contando sempre com a motivação da família.

 

 

Quando é que o fado surge na sua vida e de que forma?

 

 

Embora já conhecesse fado, ele surge na minha vida verdadeiramente durante o meu percurso académico. Eu fazia parte da Tuna Feminina da minha Universidade, Universidade Lusíada do Porto, quando me foi concedida a oportunidade de ser solista de uma das músicas do nosso repertório da altura, o Barco Negro. Foi com este Fado que despertei maior interesse por este género musical e percebi que o podia aliar a uma outra paixão que eu já tinha, que é a poesia.

 

 

A sua carreira enquanto fadista começa em 2006 e o seu primeiro disco surge em 2009. Nestes três anos teve oportunidade de actuar em emblemáticas salas nacionais e internacionais. Como foi esta fase até ter o primeiro disco?

 

Entre 2006 e 2009, foi mais uma fase de aprendizagem e conhecimento, embora sempre com muitos espectáculos. Tive desde cedo o privilégio de me cruzar com pessoas maravilhosas que me foram ensinando e orientando sobre o melhor caminho a seguir. Mas é sem dúvida em 2009, após o lançamento do meu primeiro disco, Fado Sem Tempo, que vejo abertas as portas para a internacionalização. Os primeiros anos foram decisivos para eu sentir que queria cantar Fado o resto da vida, e ter vindo a lutar para me assumir como fadista a tempo inteiro e deixar em segundo plano a Psicologia.

 

 

Como se sente ao ser considerada uma das grandes vozes do fado da nova geração?

 

 

Não sei se sou uma das grandes vozes do fado da nova Geração. Sou mais uma Voz que tenta deixar a sua marca, a sua identidade. Fico imensamente feliz que o público goste da “minha” música, do meu carisma e da forma como faço as minhas interpretações. Felizmente o fado tem vindo a renovar-se com o surgimento de grandes vozes. Espero que o meu timbre e a minha voz sejam uma mais-valia para o Fado.

 

 

O público muitas vezes divide o fado entre novo e velho. Partilha desta ideia ou acha que o fado tem vindo a renovar-se nunca perdendo a sua essência natural?

 

Precisamente. Eu acho que o fado se tem vindo a renovar. Como qualquer género de arte sofre a sua evolução natural mediante o desenvolvimento da sociedade em determinado tempo na história. Todo o fadista tem que amar, cantar e sentir o fado tradicional. Mas isso não impede que a sua alma fadista e a verdade com que sente a poesia, não seja encontrada em fados mais contemporâneos compostos por outras sonoridades. Nós conhecemos a essência e a raiz do fado, mas também gostamos de arriscar em novas sonoridades e cativar novos públicos. Haverá sempre momentos, onde só nos irá preencher o fado tradicional…nunca o que esqueceremos…

 

 

Quando começou a preparar o segundo disco “Madur”?

 

A vontade já existia há vários anos…começou a pôr-se em pratica há uns longos meses atrás.

 

 

Este disco não tem apenas Fado tradicional. Tentou trazer para este disco novas roupagens ao Fado?

 

Sim. O Madur, embora ainda conte com fado tradicional, tem também, e na continuidade da tendência desta nova geração, novas sonoridades e outros instrumentos que não só o clássico trio de cordas. Também senti vontade de arriscar em outras sonoridades que ainda não havia arriscado enquanto fadista. Podemos encontrar em alguns temas, o piano e bateria.

 

 

Em “O Fado Voltou” a letra diz “Um dia o fado afastou-se/para longe da minha vida/o que essa ausência me trouxe/foi uma alma triste e dorida” da autoria de Fernando Gomes dos Santos. É o retrato da sua alma fadista?

 

O fado tem de estar sempre presente na minha Vida. Quando passo mais dias sem cantar a minha vida não anda tão preenchida. Parece até que tudo me irrita e nada corre bem. Faz-me falta sentir a emoção à flor da pele! É a cantar que muitas vezes me encontro comigo própria.

 

 

Em “Canto da Viagem” de Fernando Gomes dos Santos, diz a letra “quando canto dou-me de alma inteira/no meu canto não há meio amor”. Para si só faz sentido entregar de corpo e alma a tudo o que faz?

 

Tento sempre dar o meu melhor. Quando canto dou-me sempre “de alma inteira”, porque é como se a minha alma levitasse de olhos fechados. Muitas das vezes (provavelmente sempre) quando fecho os olhos a cantar, não é mais do que, a forma que encontro de me abstrair de todos os elementos distratores á minha volta, e encontrar a minha alma e a minha emoção compassada a cada rima da poesia.

 

 

Neste disco tal como no seu primeiro, volta a escrever (Sou saudades, Sou fadista). Quando descobre esse gosto pela escrita de canções?

 

Sempre adorei poesia… E desde cedo “rabisquei” versos soltos. Como já referi o que me fez apaixonar mais pelo fado foi precisamente a poesia nele existente e o sentido e força que as palavras ganham ao canta-las. Não consigo explicar…Embora os meus poemas não se comparem á mestria dos de mais que me foram oferecidos pelos meus queridos poetas, arrisquei mais uma vez em interpretar coisas da minha autoria.

 

Este espaço de tempo (seis anos) entre os dois discos, traz uma maior maturidade e exposição da sua essência natural a este disco?

 

A experiencia, as vivencias e a própria vida, vai-nos amadurecendo e moldando. Neste disco estou mais genuína. Algumas letras tocam a minha própria história de vida. Tenho também temas originais que começam a definir a minha identidade. O Álbum chama-se Madur, é meu homónimo, porque também eu me renovei e me apresento artisticamente só como Madur, deixando “cair” o meu nome Cláudia. Assim assumimos um recomeço, uma viragem com uma identidade definida.

 

 

Até pela escolha do single “Vem de expresso”, este disco é uma viagem pelas suas vivências?

 

Mais do que uma viagem pelas minhas vivências, eu convido a uma viagem pelos sentimentos de cada um. Desde a alegria à nostalgia, desde o desencanto ao amor, desde a vontade de bater o pezinho no chão ao fechar de olhos e embalar a emoção…tudo isto está presente no álbum Madur.

 

 

Contou com uma equipa de músicos de enorme qualidade na gravação do disco. Quando começou a pensar em quem queria que a acompanhasse nesta viagem de “Madur”?

 

Tudo aconteceu de forma muito natural. Aceitei o desafio do meu produtor, o Valter Rolo. E espontaneamente a equipa foi-se formando.

 

 

O amor continua a ser um bom tema para o Fado. Isto porque no single de apresentação deste disco, a letra fala de um romance…

 

O amor é provavelmente um dos sentimentos mais genuínos e bonitos do mundo. Por isso é normal que o Fado o continue a cantar e a querer interpretar. Creio que todo o ser humano luta para encontrar o seu grande amor durante a vida…uns encontram-no mais cedo…outros vão andando em círculos, outros passam por ele e não se apercebem…e assim se vai escrevendo o Fado de cada um, O meu Veio de Expresso.

 

 

Qual a principal mensagem que tenta transmitir ao público através deste disco?

 

A grande magia da música e em especial do Fado é que permite que cada um sinta aquilo que o seu coração ordena em determinado momento. No entanto quero acima de tudo transmitir mensagens positivas e de coragem, como podemos encontrar no tema Voa. O Madur está envolto no tema” Viagem”, sejam viagens da experiencia da vida, sejam viagens de sentimentos à flor da pele.

 

 

Com base neste disco, conta com uma digressão internacional. Por onde irá passar Madur?

 

Vamos andar um pouquinho por todo o lado, desde a Argélia, Espanha, França, Alemanha, Canadá. Em Portugal irei apresentar o Madur dia 16 Junho na Casa da Musica. Estamos em constante actualização da nossa tour no nosso site oficial www.madurfado.com

 

 

Como se define enquanto fadista?

 

Canto fado sempre com a verdade do que sinto no momento. O meu sotaque do norte traz-me a genuinidade das minhas raízes. O meu timbre é suave por isso as minhas interpretações tornam-se mais contemporâneas. No Fado e na Vida tento ser sempre eu própria, não gosto de rótulos nem de adjectivos supérfluos.

 

 

Uma mensagem para os seus seguidores…

 

Agradecer antes de mais todo o carinho e apoio que tenho vindo a receber ao longo dos anos. Desejar que a minha música os faça mais felizes. Espero também que o “Madur” seja a companhia de muitas horas de viagem ou momentos em família.

Rui Lavrador

Iniciou em 2011 o seu percurso em comunicação social, tendo integrado vários projectos editoriais. Durante o seu percurso integrou projectos como Jornal Hardmúsica, LusoNotícias, Toureio.pt, ODigital.pt, entre outros Órgãos de Comunicação Social nacionais, na redacção de vários artigos. Entrevistou a grande maioria das personalidades mais importantes da vida social e cultural do país, destacando-se, também, na apreciação de vários espectáculos. Durante o seu percurso, deu a conhecer vários artistas, até então desconhecidos, ao grande público. Em 2015 criou e fundou o Infocul.pt, projecto no qual assume a direcção editorial.

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