Raquel Tavares concretizou o “sonho da minha vida” subindo ao palco do Coliseu dos Recreios em Lisboa, depois de ali ter ganho a Grande Noite do Fado, decorria o ano de 1997, mais precisamente a 28 de Junho.
Com apenas 12 anos foi vencedora da Grande Noite do Fado, nesta sala, e foi com essas imagens que se iniciou o espectáculo de ontem, que contou com casa cheia, embora não esgotada. A acompanhar as imagens, projectadas numa rede que cobria o palco, ouvia-se a voz de Raquel. A rede assim permaneceu nos primeiros três temas, enquanto a fadista viajava por melodias do fado.
A rede por fim subiu e Raquel dirigiu as primeiras palavras ao público, cumprimentando-o antes de acrescentar que “confesso que eu tinha tanta coisa para dizer…tanta coisa…” mas “prometi a mim mesma que hoje não falaria muito, pois o risco de me emocionar é grande”.
Num alinhamento ecléctico começou por apresentar alguns dos temas do aclamado disco, “Raquel”, que lançou no ano passado e que sucedeu a “Bairro”, este gravado em 2008, que por sua vez tinha sucedido ao álbum homónimo, “Raquel Tavares”, gravado em 2006.
“Gostar de quem gosta de nós” de Tiago Bettencourt foi o ponto de partida para um desenrolar de novelo chamado “Raquel”, seguindo-se um bem interpretado “Sombras da Madrugada” (não integra o novo disco), antes de viajarmos pela “Tradição” de Miguel Araújo e um “Limão” que contou com o público a cantar o refrão, como aconteceu em Sombras da Madrugada, em que também se fez ouvir, para agrado da fadista.
“Não me esperes de volta” fez a rede voltar a descer, sendo nela projectadas imagens da fadista, seguindo-se um excerto com imagens do documentário “O Fado da Bia” no qual Raquel participou, proporcionando ao público algumas risadas com uma conversa apimentada e bairrista com uma das inspiradoras do seu fado. Homenageou-a envergando um xaile (da Bia) e cantando fados que foram criações icónicas de uma das vozes mais marcantes daquela geração fadista e que ainda hoje servem de inspiração a muitos jovens que encontram no fado a sua arte.
Em palco foi acompanhada por André Dias na guitarra portuguesa, Bernardo Viana na viola de fado, Daniel Pinto no baixo e Fred Ferreira na bateria e percussão (em apenas alguns temas). A habitual guitarrada foi bem interpretada permitindo ao trio de fado mostrar qualidade e virtuosismo.
De regresso ao palco e ao disco “Raquel”, trouxe um clássico de Rui Veloso, “Regras da Sensatez”, antes de falar das suas inspirações fadistas, uma geração da qual muitos já partiram, mas que continuam bem presentes na memoria de Raquel, quer por conhecimento que tenha travado com eles quer por fados de outros que a inspiraram e que continua a cantar.
“Senhora do Livramento”, uma criação de Maria da Fé, “Olhos garotos”, uma criação de Lucília do Carmo ou “A candeia”, criação de Fernanda Maria, “Reza por mim Lisboa” ou “Ardinita” foram alguns dos temas interpretados num momento mais dedicado à canção nacional. Embora reconheça que o último disco “não é um disco de fado tradicional” mas “sim uma fadista a cantar canções”, assume que “não deixei de ser fadista” e que “cantarei fado o resto da minha vida”.
A interpretação, linguagem corporal e alma são todas elas fadistas, mas Raquel não se prende a apenas um género musical e prefere que a sua arte viaje por vários géneros, dá ao seu público, o mundo que tem dentro de si, um mundo que foi percorrendo em digressões ou apenas porque a vida assim o permitiu. São todas essas vivências que ontem partilhou, através do seu canto, no Coliseu dos Recreios. Os efusivos aplausos do público, são garantia de aceitação e agrado por parte de quem a segue.
“Fui ao baile”, um tema que tem sido habitual nesta digressão, permitiu além de mostrar toda a qualidade do seu aparelho vocal, apresentar um lado interpretativo da história do poema.
O concerto aproximava-se do seu término mas tempo houve ainda para “Meu amor de longe”, “Rapaz da camisola verde” e “Deste-me um beijo e vivi” que antecedeu um encore que levou Raquel para o meio do Coliseu, sem suporte de som, apenas com os instrumentos acústicos, cantar “Estranha forma de vida” que terminou com uma explosão de aplausos e vivas à fadista que regressou a palco para fechar o espectáculo com o seu “hit”, “Meu amor de Longe”.
Raquel Tavares sobe hoje ao palco do Coliseu do Porto, concretizando o maior sonho da sua vida: actuar nos Coliseus. A vida é longa, quais os próximos sonhos da menina que se tornou mulher e num dos símbolos maiores, actualmente, do fado?