Elmano Sancho levará a palco a peça ‘Maria, A Mãe‘, no Teatro da Trindade, em Lisboa, a partir de 12 de Novembro. Assina o texto e encenação, e integra também o elenco.
Elmano Sancho concedeu uma entrevista ao Infocul, para abordar esta peça e todo o processo desde a escrita até à encenação e ainda sobre o regresso aos espectáculos, após o período de confinamento.
Com texto e encenação de Elmano Sancho, o elenco é composto por Elmano Sancho e os atores Custódia Gallego, João Gaspar e Lucília Raimundo, esta peça estará em cena até 20 de Dezembro.
Elmano, quando começou a ser pensada esta peça?
Em 2017, quando apresentei alguns excertos de Maria, a Mãe e José, o Pai ao concurso para a Bolsa de Criação Literária da Direção Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB). Concluí os textos, ao longo de 2018, como bolseiro na área da dramaturgia.
Para quem ainda não leu a sinopse ou não saiba do que se trata, como descreve este espectáculo?
Maria, a Mãe, é o segundo texto da trilogia. Centra-se na figura materna e aborda temas como a perda, a dor, o envelhecimento, a solidão. O ponto de partida para os 3 textos é o oratório da Sagrada Família, um objeto com as imagens de Jesus, Maria e José, que circula, ainda que timidamente, entre algumas casas rurais. A família de Nazaré, metáfora da família perfeita, é o exemplo a seguir para quem acolhe o oratório. A Sagrada Família – José, o pai; Maria, a Mãe, Jesus, o filho – é uma trilogia sobre a família, as suas imperfeições, as suas fragilidades, as suas incoerências.
Assina o texto e encenação. Quando escreveu este texto, pensou logo nos actores que integram o elenco?
Não. Até porque na altura não tinha pensado em encenar os textos. Estava apenas centrado na escrita.
Entre o momento que escreve e o momento em que vê esse texto ganhar vida em palco, há todo um processo. De que forma este processo é vivido emocionalmente por si?
O momento da escrita e o momento da encenação são muito distintos. Nos ensaios, o texto sofre alterações. Não tenho pudor em fazer cortes, reescrever cenas, abdicar de alguns excertos do texto original. Consigo distanciar-me do autor e dar primazia ao trabalho de encenação apresentando uma versão cénica que sirva o espetáculo. O processo é emocionalmente mais intenso por ser autor, encenador e ator, o que tem acontecido em todos os meus espetáculos e acabou por se tornar uma particularidade do meu trabalho. De resto, o contexto atual acaba por ser o fator mais desestabilizador porque incerto. Obriga-me a ser ainda mais preciso, mais objetivo, mais tenaz para conseguir levar o espetáculo a bom porto. As variáveis que não conseguimos controlar pregam-nos partidas diárias. Manter a serenidade e o foco é o maior desafio.
Esteve recentemente, e com sucesso estrondoso no Teatro Nacional D. Maria II, e agora leva um outro espectáculo ao Teatro da Trindade. Como está a ser este regresso aos palcos, no pós-confinamento e com todas as regras em vigor?
Hoje, a projeção num futuro, mesmo a curto prazo, é difícil porque demasiado aleatória. Continuamos a trabalhar sem saber se poderemos apresentar o espetáculo tendo em conta a propagação exponencial do vírus e as medidas restritivas que poderão vir a ser aplicadas. Lidar com este grau de imprevisibilidade é duro.
Qual a mensagem que pretende transmitir com este espectáculo?
Não penso na concepção de um espetáculo do ponto de vista da transmissão de uma mensagem. Neste momento, estou interessado em explorar o tema da família. Falar da figura do Pai na ausência da figura da Mãe, da figura da Mãe na ausência da figura do Pai e da figura do Filho na ausência da figura do Pai e da figura da Mãe. A figura (arquétipo) permite alcançar um sentido mais lato e, portanto, universal. Ter como ponto de partida a família de Nazaré, simbologia da família perfeita, é uma base sólida para explorar as imperfeições da família (tradicional, e não só).
Este é um espectáculo com alguma mensagem religiosa?
Não. Mas a influência da simbologia religiosa no meu universo imagético é muito forte.
Qual a lotação da sala e os horários das sessões, para quem queira ir ver?
O espetáculo estará em cena de 12 de novembro a 20 de dezembro, de quarta a domingo, sempre às 19h. A lotação (com as restrições impostas) é de 25 pessoas por sessão.
Em termos de encenação, quais são os maiores desafios neste espectáculo?
Neste primeiro momento, o desenho cénico numa sala exígua como a sala estúdio do Teatro da Trindade obriga a um trabalho de pormenor, mais introspectivo, mas não menos intenso, a um maior rigor no gesto, na partitura física, na intimidade (possível) criada com o espetador, a uma visão cinematográfica, com enquadramentos, ângulos e perspectivas.
Um actor vive muito com emoções. Como tem sido esta aprendizagem numa altura em que estamos mais contidos nos afectos?
O maior desafio é continuar a reivindicar e validar o território da intimidade como temática principal quando o toque e a proximidade trazem consigo o cheiro da doença e da morte.
Porque motivo devem as pessoas ir ver este espectáculo?
A(s) família(s), em todas as suas formas, é o pilar da sociedade e da comunidade. Todos fazem parte dela(s).
Qual a mensagem que deixa aos nossos leitores?
Apoiem a cultura. Venham assistir ao espetáculo (com todas as precauções necessárias). Nos tempos difíceis em que vivemos, é, mais do que nunca, um sinal de luta e de resistência.