Reportagem: ‘Kyrios’ Bastinhas triunfou no festival taurino na Palha Blanco, este domingo.

Texto: Rui Lavrador
Fotografias: Rute Nunes e Carlos Pedroso
Esta tarde, a Praça de Touros Palha Blanco recebeu um festival taurino de celebração dos 90 anos do Grupo de Forcados Amadores de Vila Franca de Xira, cujas receitas revertem em prol da obra da Casa-Museu dos Forcados de Vila Franca.
O cartel foi composto pelos cavaleiros João Moura, Paulo Caetano, António Telles, Rui Salvador, Luis Rouxinol, João Salgueiro e Marcos Bastinhas, frente a touros da ganadaria de Paulo Caetano.
Em solitário, pegou o grupo de forcados de Vila Franca de Xira.
Um cartel muitíssimo bem rematado, composto pela cátedra do toureio equestre nacional, com Marcos a representar o seu saudoso pai, o eterno Joaquim Bastinhas.
Numa altura em que tanto se fala em ‘figuras do toureio’ eis que elas estavam aqui quase todos. À margem destes sobram muito poucos em território nacional, por muito que se proclamem como tal, sem qualquer mérito e crédito para tal.
A importante, mas a necessitar urgentemente de melhoramentos e mais conforto, a Palha Blanco contou com forte adesão do público, porque o objectivo do festival e o cartel assim o exigiam. Porém, não esgotou a sua lotação. Pena, mas os preços dos bilhetes eram longe da capacidade financeira e realidade portuguesa.
Antes das cortesias, tempo para o Grupo de Forcados Amadores de Vila Franca de Xira prestar homenagens aos cavaleiros, bandarilheiros e demais intervenientes da corrida.
Destaque-se a presença dos políticos locais, da vice-presidente da Assembleia da República, Maria da Luz Rosinha, e da embaixatriz de Espanha.
Após as cortesias, finalmente iniciaram as lides do festival, que afinal foi o que levou as pessoas à praça.
João Moura abriu praça e desenhou uma actuação positiva. Tem um conhecimento extraordinário dos terrenos e querenças do oponente que lhe calha em sorte. Recebeu bem o touro e esteve bem no desenho das sortes e no momento das cravagens. O ponto menos positivo foram duas passagens em falso e a quase nula brega. Mas Mestre é Mestre e o conhecimento permite-lhe triunfar com aparente facilidade. Lide muito agradável.
Vasco Pereira concretizou a pega ao primeiro intento com uma execução de qualidade.
Lide em crescendo de Paulo Caetano ao segundo touro da corrida. Brilhante a receber o oponente numa nesga de terreno. Na ferragem comprida, um pouco menos vistoso na brega, mas na cravagem curta foi de qualidade superior. Brega ladeada e templada, sortes bem desenhadas e reuniões ajustadas, numa performance em que deixa os amantes de arte com desejo de o voltar a ver muito em breve. Paulo Caetano, ainda e sempre, um ícone da arte e da classe.
Pega concretizada à segunda tentativa, por Vasco Dotti com muito mérito do forcado da cara e o grupo a responder bem.
Actuação positiva mas intermitente de António Ribeiro Telles. Bem a lidar, as sortes nem sempre foram bem desenhadas, com algumas passagens em falso, mas destacam-se três ferros curtos de grande qualidade no momento da reunião. Na sua praça, foi muito acarinhado e deixou momentos de qualidade superior.
Extraordinária pega concretizada ao primeiro intento por Jorge Faria. Boa reunião e a aguentar o derrote do touro, até o grupo fechar e efectivar a pega.
Rui Salvador actuou pela primeira e última vez esta temporada, segundo referiu no comunicado lançado na semana passada.
A sua actuação foi em crescendo e terminou em patamar muito elevado. Na ferragem curta esteve a grande nível, quer na brega, desenho e remate das sortes, além de cravagens ajustadas. O cavaleiro dos ferros impossíveis continua a dar aulas sobre o que é tourear. A fase inicial da sua lide foi mais irregular, sem manchar a actuação.
Ricardo Castelo concretizou a pega ao primeiro intento, numa pega com emoção, após uma cambalhota do touro. O grupo foi rápido a fechar e a concretizar a pega.
Grande actuação de Luís Rouxinol, apenas com um ou outro toque na montada evitável. Mas com a raça habitual e dando a sensação que a a cada ano se motiva mais. Bem a tourear, raçudo perante a dificuldade do oponente e a desenhar bem as sortes, rematando ainda melhor.
Caló concretizou a pega ao segundo intento, após uma primeira tentativa falhada.
João Salgueiro é um génio e por vezes sinto que o público português desconhece o que é um génio. Um génio não é aquele que faz sempre tudo bem ou que é um tipo certinho e secante. Um génio é imprevisível e dentro dessa imprevisibilidade nem tudo sai bem. E é isso que faz de um génio, alguém distinto. Isto para referir que Salgueiro não traz lides estudadas de casa. Usa o conhecimento e qualidade, assentes na inspiração e intuição do momento. E até quando arrisca e corre mal, é impossível os seres sensíveis à arte, não gostarem. Não foi a sua melhor lide, mas foi aquela em que demonstrou os dois lados do génio. E que falta temos nós de génios nos tempos actuais. Respeito e louvor a Salgueiro.
Ricardo Patusco concretizou a pega ao primeiro intento numa excelente execução
Fechou a tarde, quase noite, Marcos Bastinhas nas lides equestres. E que bem esteve Marcos na Palha Blanco. Foi receber o touro à porta dos curros, conquistando o público pela forma como, posteriormente, se dobrou com ele. A partir daí foi um compêndio de alto gabarito a cada bandarilha cravada, apostando num estilo entre o clássico e o risco, mas que resultou muito bem. Actuação magistral de Bastinhas, que terminou com o habitual par de bandarilhas. Por mera curiosidade, ‘Kyrios’ é uma palavra de origem grega que significa ‘Senhor’, ‘Lorde’ ou ‘Mestre’. Esta tarde, foi um Senhor Mestre a tourear.
Nota de destaque para o brinde feito por Marcos ao grupo de Vila Franca, apeando-se do cavalo. Chama-se classe e educação!
Mário Rui concretizou a última pega da tarde à primeira tentativa.
Por fim, não menos importante, destacar os bandarilheiros João Pedro Silva’ Açoriano’ e João Prates ‘Belmonte’, pela forma como receberam os touros, destacando-se tecnicamente dos seus pares.
Tarde entretida, como diria ‘Quinito’, no geral com os cavaleiros bem e com o curro de touros da ganadaria Paulo Caetano a cumprirem e a permitirem triunfos aos toureiros. João Moura Caetano, representante da ganadaria nesta corrida, foi chamado à praça após a lide do último touro.
O Grupo de Vila Franca honrou os seus 90 anos com uma tarde que ficará certamente na memória de quem esteve na Palha Blanco.