Nuno Guerreiro: O Último Aplauso

Nuno Guerreiro: O Último Aplauso que lhe devemos, enquanto nação, após não o termos valorizado na medida certa em vida.

Morreu o Nuno Guerreiro.

E com ele, morreu mais um pedaço bonito da nossa memória coletiva — aquele pedaço que sabe o que é a arte verdadeira, o que é cantar com alma, com carne viva, com verdade.

Nuno não era um nome de tendências. Não era presença habitual nas galas de vaidade, nos palcos do ruído, nos círculos onde a fama pesa mais do que a entrega. Era um artista raro. Desses que, quando cantam, fazem parar o tempo — como se o mundo ouvisse melhor com os olhos fechados.

E, mesmo assim… não o ouvimos como devíamos.

Portugal tem esta mania triste de ignorar os seus melhores. Confundimos barulho com talento, presença com valor, marketing com arte. E deixamos para os obituários o elogio que devia ter sido feito em vida.

A voz do Nuno era coisa de outro mundo. Inconfundível. Pura. Tinha aquela beleza frágil, como as porcelanas que se guardam num canto da estante, porque se tem medo de as partir. E, ainda assim, fomos deixando que se esquecesse. Que desaparecesse dos alinhamentos, das rádios, das televisões. Porque não fazia parte da máquina.

Como curar a nossa ingratidão?

A cultura, por cá, virou produto. Consome-se e deita-se fora. A arte deixou de ser território do espanto e passou a ser campo de batalha por likes e virais. E os artistas que nos transformam por dentro? Esses ficam à espera. Calados. Às vezes até doentes de silêncio.

Hoje, choramos o Nuno. Dizemos que era “único”, “intenso”, “eterno”. Mas talvez o mais honesto fosse admitir isto: fomos ingratos.

E talvez agora, com o vazio da sua voz suspenso no ar, possamos finalmente escutá-lo como merece. Não só o Nuno, mas todos os que, como ele, cantam sem truques. Que nos dão emoção crua. Que nos dizem aquilo que não conseguimos pôr em palavras.

Oxalá esta perda nos sirva de espelho. E nos lembre que a arte não serve para entreter. Serve para comover. Para abanar. Para nos lembrar de quem somos quando o mundo pára.

Que o Nuno descanse em paz. E que, ao menos agora, o país se levante para aplaudi-lo de pé. Mesmo que seja tarde.

Leia também: Luís Montenegro homenageia Nuno Guerreiro: “Foram várias as músicas cantadas por si que nos marcaram”

Siga-nos no Google News

Artigos Relacionados

Siga-nos nas redes sociais

31,799FãsCurtir
12,697SeguidoresSeguir
438SeguidoresSeguir
299InscritosInscrever